24.12.15

hoje, a noite é bela

Eu acredito no Mistério. Ainda que quaisquer outros nomes e características sejam dados a ele, não há quem me tire a oportunidade de ter fé naquilo que, pelas limitações de meu corpo, eu não possa sentir. O Mistério faz "mil-lágrimas", o Mistério movimenta nossas vastidões interiores. Só tenho certeza nessa vida é da existência do Mistério; e ele é o que nos une seja pela afinidade ou pela falta dela. O Mistério é o ponto de equilíbrio deste Universo que (ainda des)conhecemos. O que há em nós e o que não há compõem o Mistério. Ainda bem que será para sempre O Mistério isso a que eu já tenho acesso diariamente. Nesta data de hoje, parte das misteriosas pessoas deste planeta (eu inclusive) celebra o nascimento de uma esperança cuja imagem é humana. Algo em mim se recupera, regenera-se. É curioso. Por isso, desejo a vocês, amigxs e familiares, que, como de costume, misteriosamente, a esperança possa renascer de nossa comunhão, como as flores que resistem (e reexistem) juntinhas ao arrebatamento de uma fachada secular. Desejo que vcs celebrem com alegria e amor por e entre os seus.

3.12.15

em prol/gresso

O pó. O povo. O ópio. O pio. O ovo. O voo. O voto. O veto. O gole. O gol. O golpe? Não, o golpe não. O galope. Sim, o galope do povo. O pó na estrada.

23.11.15

paraquedas 4



...

Antes de ir além do horizonte, há o mar. E há o poder ser de sal por alguns momentos. Estátua viva. Não olho pra trás nesta praia.

...

Eu, apertando meu coração barroco (pelo qual passa um rio de contradições, eu assumo), sangro por meio de um pedido venoso, saturado: brasileirxs, sejamos mais coerentes pelo todo, pelo coletivo, pelo comum! Menos ódio, menos medo, menos terror...

...

Nem tanto em tudo. Opaco tudo. Transparência? Em nada. Chega, cega, carrega. Abra não só os olhos.

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Numa lógica mercadológica mutante para sua própria sobrevivência, agora, é preciso vender a ausência. Em voga, o não conter é digno de valor (em muitas cifras de reais; e no real). Não bastasse tanto, essa falta do conteúdo - em outros tempos agregado como importância - não nos liberta da condição de cobaias. Caro é o preço que pagamos por nos filiarmos à condição de sujeito-consumidor. Nos rótulos dos produtos, ao que parece, a COMposição pouco importará enquanto estivermos SEM lugar privilegiado: o da utopia do ser-sujeito-de-si. Em tempo: esse xampu (sem sal, sem sulfato, sem corantes, sem parabenos) vem COM cheiro - e é um cheiro bom.

...

Um salve às crianças em nós. Emaranhadas (em nós) e um tanto arranhadas às vezes.

...

Amigxs jornalistas (ou carxs colegas de profissão) e cientistas políticxs (ou pesquisadorxs de área correlata de qualquer formação), por favor, indiquem-me fontes de informação sobre a atual conjuntura política e econômica deste país nosso que valorizem a articulação de ideias em detrimento de paixões partidárias e/ou mercantis facilmente corruptíveis. Com o acréscimo de que, após os textos (em amplo sentido) críticos e informativos que tais fontes forneçam, seja possível encontrar comentários de (e)leitorxs (no espaço aberto para tanto) que fomentem o debate em prol do amadurecimento democrático brasileiro em vez de reproduzirem clichês odiosos uns contra os outros. Isso que procuro existe?

...

Tem gente achando que redigir uma dissertação interessante, que se destaque entre os demais textos, é FALSEAR aquilo que costuma vociferar na internet ou nas filas do supermercado. Tsc, tsc, tsc... Não se iluda: ideias odiosas sempre escapam das entrelinhas. ‪#‎enem2015‬ ‪#‎notazeroproódio‬ ‪#‎machistasnãopassarão‬

...

Costurando leituras sobre o discurso, vou descobrindo aos poucos que a ideologia, realmente, não dá ponto sem nó(s). Alinhavar os sentidos é impossível, mesmo. Então, aceito pra doer menos.

...

31.10.15

‪#‎ajudasãolonguinho‬

E quando a gente não acha as palavras? Três pulinhos e três gritinhos resolvem?

6.10.15

atual

Eu queria ter disposição pra escrever tudo o que penso sobre tudo o que conheço do mundo. Queria que toda a gente me conhecesse ou me desconhecesse de fato. Uma indisposiçãozinha aqui, outra ali... E muito ou pouco reconhecimento depois, eu teria atualizado não só minha timeline, mas um conjunto de assujeitamentos que me oprimem/ reprimem. Entretanto, se meu querer não é sempre o resultado de uma potência, fico aqui só de olho nas nossas frequentes visitações à casa das renúncias e denúncias que compartilhamos diariamente pela internet. Fico mal pelo jeito de ver a vida por seu lado mau às vezes. Atual e malmente, eu me recupero dessa angústia desconfortável assim: faço uma ‪#‎selfiedespretensiosa‬ e tudo passa, como ferro quente sobre camisa engomada.

29.9.15

panela-depressão

faz um tempo,
à sorte do fogo,
a panela vem esquentando
as memórias,
sinalizando,
por um apito melancólico,
os futuros inexistentes:
psiusiusiusiu...

atmosferas, celsius —
nenhuma condição
é normal na clausura
da particular iminência
de explosão

agora, Remo prefere o cozer
rápido e histérico de sua angústia
ao antigo e calado banho-maria que nunca aquieta os sintomas

"está na hora de
falHar mais sobre isso,
Remo", diz x terapeuta
na primeira sessão

29.5.15

mangueira

Com o amadurecimento - manga amarelando, carcomida por passarinhos, machucada pelo que a vida é de fato: essa brutalidade -, venho, finalmente, dando significado ao que é "se endurecer" e como isso é importante frente à realidade. Sim, estou endurecendo-me, principalmente, quanto ao que machuca a humanidade que desejo preservar em mim. Estou endurecendo-me, repito. Mas não perco a ternura, definitivamente, de vista. Ainda que, vez ou outra, ela se esconda entre as maçãs, as bananas, os limões inertes na fruteira sobre a mesa. A ternura tem cheiro de manga, difícil de ser confundida com qualquer outra fruta, e é suculenta quando madura. Duro é seu caroço. O duro é ser caroço. "Chupo essa manga" e me lambuzo naquela célebre frase do Che Guevara. Há de se chegar ao caroço, mas jamais desperdiçar a polpa.

então, tá

camisa estampada, calça lisa
meia invisível, tênis cano baixo
rosto redondo, óculos retangulares
barba volumosa, cabelo à máquina
música? independente - por amor
se dia, fraco perfume
olhos cruzados, um papo vem
beijo bom sabor melancia, tudo a despir
caso role, só com camisinha
gostar da tattoo escondida, uma ligação no dia seguinte
e fica tudo meio que combinado assim:
seus significantes, nossos significados

o poeta é um fabulador

Se não me emendo às vezes em uma conversa séria é porque fico na "reparação": dúbia palavra, que ora costura uma poética, ora me faz olhar fixamente meus arredores. Me evanesço na observação da paisagem e de seus habitantes (coisas, bichos-outros e bicho-homem), esperando os conflitos que nela e entre eles se impõem, sobrepõem-se. Por isso, gosto mais de escrever fingimentos do que relatórios.

Posso confabular, né?

Os salva-vidas ficam nesse mesmo exercício. À frente, uma paisagem de risco. Uma beleza traiçoeira de força fenomenal. Cada câimbra é um evento. Crise no mar. Mocinhas e mocinhos em beijos de cinema, fôlegos em ultrapassagens, avanços de sinais, e massagens no ego - ainda que cardíacas.

Quando um acidente? Quando uma fatalidade?

Todo mundo deveria se permitir a simulação de um afogamento um dia. O faz-de-conta é um bom pedacinho da existência, um zelo consigo mesmo, um colete flutuante.

Finjo esse bote inflável. Ou inflo esse bote fingível. Justo porque não me dá pé só molhar os dedinhos e a nuca em marolas frouxas. Meu brinquedo é abissal. Yellow submarine.

paraquedas 3

Fale o suficiente. Escute sem medida. Motoristas e não motoristas agradecem.

...

Viver é present continuous. Não resista à existência. Corpo presente. Alma idem. Experi/m/ente.

...

Se mudá-lo parece tarefa impossível, deixar o mundo menos feio pode ser um plano Z. Finalmente.

...

A brecha, o breu, o bruto. A identidade está não só em nossas ranhuras, mas nas cargas de tinta que conseguimos amparar na superfície. Enquanto o interno for um buraco negro insaciável, a pele será essa tábua de textos e texturas impossíveis de (se) interpretar.

...

No consultório do oftalmologista, entre Caras, Claudias e cia., uma pilha de VEJA. "Quanta miopia na sala de espera, doutor!", assim eu enxergo essa ironia... Para minha luz, ainda bem que minhas pupilas já estão dilatadas. Trocarei os óculos, mas me manterei de olho no todo, em tudo.

...

Enfim, me equilibrando sobre esta linha tênue e movediça entre a faixa etária e a faixa etérea, eu consigo um bocadinho de tranquilidade. Fiz as pazes com o tempo, procurando reconhecer a duração das coisas em vez da trajetória dos ponteiros. É possível. É possível!

...

Ainda há frestas. Há festas de afeto! Não há ódio que resista a um prédio sob nova habitação. Nós, os afetuosos, unamo-nos para ocupar/tilhar cada metro quadrado desta casa abandonada dentro do Outro.

...

Meu pensamento tende a se palavrear com a extrema-canhota. Tô avaliando uma reforma cognitiva para evitar conflitos de interesse entre minhas mãos. Não quero ter uma (mão) direita dominante que aprendeu com cartilhas e caderninhos de caligrafia a se "manter na linha". Discurso de ódio não é o mesmo que fazer oposição. De que lado da cama latifundiária se consegue dormir tranquilx depois de apregoar desumanidades? Hein? Pela ausência de uma confortável queen size, tenho dormido num tatame sem fim, estendido em meu íntimo, que é um vasto território de lutas ideológicas entre mim e o que compreendo vir do Outro. Não reparem no t(r)emor deste mal de Parkinson.

...

A felicidade é resultado de um paisagismo cuidadoso.

...

Namoradeiros. Um escândalo na vizinhança. O verde-amarelo é a fantasia, o fetiche dos papagaios. Mas o canto é da nudez. Tenho preferido o acasalamento ao sexo (de ocasião), como eles, ultimamente. Bico com bico, asa com asa. E ninho.

saia para rodar

Tecendo comentários sobre o reencontro, eu te faria uma saia. Daquela de mesmo tipo, que não me saiu nunca da lembrança. Te faria uma saia para teu gênero. Uma saia de chita, com florimentos e floreios. Uma saia com uma única orientação: saia para rodar; e virar minha cabeça. Alfaias no peito de um alfaiate.

invocado

Cada vírgula tua no devido lugar gera créditos. Eu me apaixono, especialmente, pelos teus vocativos que dizem respeito a mim. E eu honro com os acordos que me excitam. Enquanto os corretores dos celulares não souberem como organizar a inversão da ordem de nossa Língua, eu confiarei em nossas línguas, sem pausas, se encontrando no céu e no inferno de nossas bocas. Eu te devo meu fôlego, moçx.

20.5.15

do público da performance pública

gente pra ver ator pelado
gente pra ser atropeladx
tem gente pra toda performance

per se
gente for what?
a wo/man
gente-vo

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Para e com Fernanda Pérez.

19.5.15

reconheço firma

no largo do leito,
lençóis festivos

no aperto do peito,
feitiço brando

de que trato?
de qual trato entre nós?
em contrato
(longe de quaisquer
burocracias, viu?):
envolvimento
e encantamento

rubricas
em todas as faces
deste .doc;
eu deixo
t/eu beijo,
eu nos imprimo

1.5.15

entre pares, os parênteses

eu sou um bom (coração) partido,
daqueles que se quer encontrar (encomendar sem esforço)
nos apps de paquera

eu tenho (poucas e boas) histórias íntimas
que conto (e que dou conta nos dedos) sem medir
palavra alguma:
(falo?) a verdade
- sem máscaras
(mas só um pouquinho de maquiagem, vai...)

preste mais atenção (aos meus parênteses)
quando eu disser sobre o clima (ou climão!)
que se estabelecer entre nós:
pode (não) ser tão bonito...


19.4.15

vaga

era só um vaga-lume no canto do quarto
e eu pensei que fosse o led do computador

o que economizei no bilhete da Eletropaulo
gastei em perplexidade

fechei
abri
fechei
abri
os olhos

perdi a conta,
o sono

1.4.15

sem cessar

eu te escreverei eu me escancarei eu nos falarei em breve passado o passado aberta a janela da sala de esperanças estou namoradeira observando o cotidiano uma vista devassada de mim uma cortina empoeirada na máquina de lavar é um café quente sobre toalha de mesa que derramo cama coberta de chita eu te escreverei eu me escancarei eu nos falarei em (minha fofoca) breve

---
para ILT

16.3.15

memorizar

duração, dimensão:
o tempo nunca é,
diz o corpo

corpo-tempo: era
o corpo tem poeiras,
eiras beirando o abismo
das reflexões

o tempo não ampara
o espelho espalha,
então, uma visão
narcisista do ser:
eu me reconheço

o tempo será minha recaída
no gargalo da ampulheta

tem pó
pra café
e filosofia

tanto pó
quanto tem poema
na varredura do quarto de dormir
e acordar

pelos e peles
são meus calendários

9.3.15

a calçada é pública

me toma de assalto
o homem posto
na calçada

rouba de mim
o risco,
o traço
de um horizonte tranquilo

e o marginal sou eu,
e o marginal é ele
enquanto o público
aplaude de pé

o público
encoberta

todo dia é frio
às margens do asfalto

8.3.15

Jaçanã não sai do lugar

fui comprar tíquete,
fui beber cafezinho,
fui ler manchetes na banca,
fui checar o pulso às 23h
"trem, mas acabou"
- foi o que me disseram
agora, amor,
posso ficar
quantos minutos
queira
mamãe,
sinto muito:
só amanhã de manhã;
vá dormir, vá

2.3.15

bacia/das ch/uvas

a/manhã de sol é de/morada
ch/amo vem/to com bacia
de ch/uvas na mão
bento c/acho
que ha/verá tempestade
no c/eu da boca
já não morre/ria
de sede:
ar/de
cor/tar-se
com/o
fruto
em sua
meta/de
vim/ho
seco
na pre/visão
do tempo/ral

27.2.15

Wo ai ni

na etiqueta daquela pelúcia
em forma de coração,
além de instruções de lavagem
e códigos de barra,
havia um escrito indecifrável
para aquela menina:
我爱你

antes fosse uma garatuja,
um homem palito,
uma casinha desenhada
na infância,
uma ilha com dois coqueiros
e gaivotas ao redor

antes fosse um texto bíblico,
uma bula de remédio,
um anúncio de compra e venda,
uma nota de rodapé

antes fosse só bater no Google

mas eram made in China
aquelas palavras

nem de olhos apertados,
forçando-os pela ausência dos óculos
ou forjando uma visão oriental,
ela saberia que o que ele lhe diria
pouco importava como se escreveria

todo romance tem seu tantinho
de ideograma,
ela entendeu
e se deu por satisfeita

casar-se-ão em breve

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para Cristiane Modolo e Edgar Alencar

5.1.15

a hora das estrelas

no silêncio escuro
de uma noite de blecaute,
postes, TVs, liquidificadores
em segundo plano

as revelações de estrelas,
das estrelas que somos
e que observamos
- se preciso, cairemos juntos;
não tema, eu lhe disse

este é um registro em timeline,
um traçado caudaloso da trajetória estratosférica
de um, agora, presente aceito

me sinto maternalmente inteiro,
amamentado,
num pacto com a via láctea

e é lindo estar no colo de mãe, explicando-lhe sobre as luas, rotações, estações dos anos que se passaram ante e entre nós

---
para Maria Zélia, com o amor e a gratidão que até então eu jamais sentira