12.12.14

condições anormais de temperatura e pressão

na nuca,
nunca resista à pressão
de uma ventania
anunciada por soprinhos mornos meus

beijo, sim:
permita-me precipitar atmosferas
ao nível do mar
em poucos estalos

língua e devassidão

esqueça a hora de acordar
amanhã
temos tempo, temperaturas
e amigos médicos
que atestariam
uma noite febril

10.12.14

Jaime é difícil de dobrar

Jaime segue bem
por entre essas duras dobras
e dobraduras
né, Jaime?

...

diga alguma coisa, Jaime,
um je t'aime bobo que seja

erre-esse-vê-pê, Jaime, essa declaração, esse convite, aquele torpedo
recorte e cole algo da internet,
do BuzzFeed, da caixinha do chocolate belga

fale com o corpo:
olhos fugidios,
mãos coçando a orelha,
pernas inquietas

...

está bem, Jaime,
troco este meu papelão
por sua papelaria muda

você me dobrou
uma vez mais,
e mais uma
et cetera

conheço seu origami

5.12.14

lonjura

chega mais
perto

chega junto
logo

aperto

vc foi longe demais
já chega!

27.11.14

altas horas

pontualmente:
protetor solar, 6h
creme dental, 12h
loção hidratante, 24h
desodorante, 48h

no armarinho do banheiro,
só não se encontra
um ponteiro que marque
a hora certa; tudo é
bomba-relógio,
marcapasso

17.11.14

não falta

Trouxa cheia de sujidade. Extrato de tomate. Largou de molho. Branco fosse. Era negra fossa. Foi-se. Foice é como saudade cortante: um pouco de doença, um pouco de saúde notáveis. Nota de cem no bolso da calça jeans. Peixe no aquário. Eu, nada. Fora d'água. Ciclo rápido na lavanderia.
Falta pouco. Há pouco faltava. Chuva trouxe.

11.10.14

tiros in Columbina

deslocamento
deslocalmente
desloucamente
descolamento
deslamento
deznaescola

tiro/s

no baile,
a sapatilha,
a máscara,
a fantasia,
o Pi errou
o alvo

Morre a melhor aluna deste carnaval fora de época



9.10.14

emotionalphone s2

"Cadê o coração? Cadê o coração?", eu me perguntava aflito por não encontrá-lo entre os emojis do WhatsApp. Sim, esqueci que tenho um reserva no meio do peito, à mesma altura em que uso o smartphone para teclar - um pouco mais à esquerda, melhor identificando no mapa.

Recalculando rotas, valores, hábitos a partir de agora. Bateu forte quando me dei conta.

5.10.14

cadê?

eu, às brasas
vc, abra asas
- por nossos voos,
por si, por mim
vai...

depois,
nós, na noite,
como estrelas
cadentes,
carentes,
sumindo de vista

viu?

4.10.14

2.10.14

m/andou mal

Zezinho anda mal das pernas. Mal anda meio quilômetro e logo tropeça em seus erros espalhados pelo vento dias antes. Malandro que é, Zezinho largou as malas no caminho. Melhor com mochilas. Bagagem de mão. Mais fácil manusear as letras já que as palavras se destroçaram; são sílabas e pausas. Zezinho, agora, m/anda tudo de ponta-cabeça depois daquele Wanda/val.

19.9.14

castigo merecido

Sinto que não sei
Quando amo
Sinto que não sei
Nada mais
Sinto
Que não sei
O que não sou
Me sinto malcomportado

---
Leia tb no re/verso, ame sem se comportar bem.

12.9.14

não tenho local

Vc-qualquer diz "tenho local", mas o que busco, mesmo, é um lugar. E não aquele do lado direito da queen size. Busco um lugar que me identifique em xis posição sob lençóis, chuveirões, céus estelares. Indico: um lugar com meu RG, assinatura e digitais. Um lugar num futuro cartório, num futuro altar, num futuro presente desembalado - regalo dos padrinhos. Melhor, um lugar no presente, longe das baladas ruidosas. Em vez disso, perto de nós, haverá silêncios desconcertantes - não conseguiremos evitá-los sempre. Mas sei colocar as palavras em suas devidas ordens, ordenações. Fora das quatro paredes, inclusive, posso ofertar: "tenho lugar pra vc". Tá a fim?

27.8.14

m/eu presente

tornar-me
somente
depois de tombos,
tomos,
túmulos

eu não.

antes disso,
não me tirar
o direito
de ir e devir
o que seja

venho a ser eu.

20.8.14

essencialíssimo

estou elaborando um perfume,
longe de querer a perfeição dos frascos franceses

mas vou buscando uma nuance
essencial em mim,
inspirando-me em flor que se cheire

até o próximo despetalar-me em quereres:
bem ou mal

14.8.14

documento

Escrevo porque me comprometo com meu pensamento, meus desejos. Prova efêmera das minhas crenças. Divido-me entre as angústias da prisão de se manter uma postura una frente às coisas e a sensação de ser bexiga com hélio - vermelha - no encontro com as nuvens (algo da ordem seixaniana, ambulanteana).

É uma forma de me lembrar sobre minha (po)ética. Reconhecer minha firma. A escrita me autentica, me documenta.

12.8.14

ao te reencontrar no Tinder

quando incógnito o desejo,
não sei...
se texto ou imagem
se amigos ou interesses
se avanço ou retrocesso
se papo ou silêncio

xis ou coração:
apertar o quê?

na dúvida kind of shake/speareana,
de abalos e chacoalhões dentro do peito,
apertarei os cintos
neste avião em turbulência
(por favor, desliguem seus celulares)

esquerda ou direita?
usar os dedos
pode ser um deslize
incorrigível

aplicadamente,
evitarei o imperativo do aplicativo
mientras que
enquanto
las piernas
tiem-
as pernas ainda
-blan
tremerem

10.8.14

quer dizer

A coisa mais bonita
que posso dizer
é a coisa não-dita

Mas eu não me convenço
com minhas próprias
reticências

(e insisto em me explicar
entre parênteses,
paredes,
parejas)

8.8.14

r/emoção

O amor me (re)move
Me tira e põe d/nos meus lugares
Me leva a qualquer parada
Me dança, me lança, me enche a barriga

O amor é uma divindade em nós,
É encarnação,
abstração,
desobstrução

A nós, sujeitos em verbo,
joelhos dobrados à palavra
mais sentimental de todas,
eu sugiro:
Amemos o próximo
(e os distantes)
sem muitas explicações

29.7.14

deboche palhacesco

No carnaval, o nariz é bem vermelho
Nos protestos populares, também
Mas no dia a dia, na falta de uma fantasia
- ou de uma utopia -,
corpo inteiro na realidade,
qualquer um grita que não é

Não entendo essa palhaçada

28.7.14

Skyporenquanto

[22:14:28] romulo.osthues: Eu balanço
[22:14:35] romulo.osthues: em toda corda
[22:15:01] romulo.osthues: banda toca
[22:15:06] romulo.osthues: apreensão
[22:15:41] romulo.osthues: Tensa linha tênue
[22:15:55] romulo.osthues: entre mim e ti
[22:16:19] romulo.osthues: - uma internet
[22:16:50] romulo.osthues: Afeto já
[22:16:59] romulo.osthues: on-line seja
[22:17:25] romulo.osthues: presença aqui
[22:17:36] romulo.osthues: aí presença
[22:17:54] romulo.osthues: Eu/quilíbrio
[22:18:07] romulo.osthues: Vc amparo
[22:19:11] romulo.osthues: O riso é
[22:19:45] romulo.osthues: um querer
[22:20:02] romulo.osthues: entre os dentes
[22:20:12] romulo.osthues: e o que está no peito
[22:20:20] romulo.osthues: Meu riso é ter
[22:20:24] romulo.osthues: seus sinais

---
Para S.

light metal

No sax
Me toca o sex
Me toca de qq maneira
Sem partitura
Com mordedura
Boca onde queira
Mas queira em mim
Essa canção que tem na cabeça
E no tatear sobre meus metais
Light metal

---
para S.

25.7.14

ufanias

Aqui dentro, o que aberto é peito é também um coração à vista. Eu trago nele um amor florestal, costeiro. Desejos de bicho do mato: de coqueirais, dos manguezais, das ciliares de rios. Paixões por dunas, chapadões serenos, véus de noivas em casamento, atlântica mata longe do litoral. Ah! Saltos em altura - paraquedas em Boituva que nunca experimentei. Infinito à vista ainda que no pico haja neblina. Pampas com vastidão verdejante. Em tudo isso, eu me encontro.

Trago um amor na medida do nosso contexto... ora árido, ora submerso. Um amor brasiliano. Amor ao natural neste território feito de céu, terra e sol. E de águas doces e salgadas que diários banhos nos doam. M/e/o/rgulho.

23.7.14

O preço de não ter preço OU Como lidar com os recursos

Não sou barato, nem caro. Faço negócios interpessoais não por dinheiro. Resisto a acreditar que todo mundo tem um preço.

"Atleta jamaicano é avaliado em 20 milhões de uma-moeda-qualquer", anuncia o jornal de hoje. Eu me recuso a ter cifras e etiquetas de remarcação atrás do pescoço. Estou, mesmo, é de graça. Sorriso gratuito do início ao fim da quarta-feira. E nos outros dias da semana também - inclusive, fora da xepa. Não... Não rasgo cédulas, nem derreto moedas. Dinheiro é recurso, assim como água, alimento, tempo. Uns têm muito, outros nem tanto. O segundo é o meu caso. Por minha (ir)responsa, vivo, atualmente, com dinheiro insuficiente. Hahaha

O jeito é rir. Quem dera a leitora de código de barras entendesse meus sorrisos! Concessionária de energia elétrica, operadora de telefonia, prefeitura municipal... todas elas seriam pagas a gargalhadas. Falo disso com vcs pq sei que parte de nós tem uma relação angustiosa com o dinheiro. Repito: parte de nós. Cada um com seus motivos para tanto.

Dei um jeito nisso. É que optei por manter uma relação "de respeito" com ele, e com tudo o que o dindim pode favorecer. Entendendo-o e o valorizando como recurso, e não como divindade, estou à mercê das demandas por ele. Gero um extra para tal coisa, facilito xis atividade, compro chocolate, pago o aluguel, as viagens de que tanto gosto... Acumularei se for preciso - o inf/verno chega para todos uma vez ao ano, né? Fico bem assim (mesmo que alguns torçam os narizes para essa postura). Continuo, portanto, sem valor de mercado, sem um preço afinal, mas coerente com o modus operandi de nossa economia - estou nela por opção, devo assumir.

Toda essa fala aí de cima tem uma finalidade na real. "Eu poderia estar roubando, estar matando", mas tô escrevendo (com a veste de um captador de recursos voluntário). Hahaha

Se em algum momento eu "passar o chapéu", colabore com o recurso que for (dinheiro, água, alimento, tempo... lembra?), puder e quiser. A demanda será legítima e coerente. Eu não fiz voto de pobreza, mas estou disposto (quase sempre) a colaborar com a redistribuição de recursos disponíveis por aí para quem os requer bastante. E tenho ficado cada vez mais alegre por saber que formamos uma rede em expansão. A pesca é mais fácil assim.

Quando "minha jangada sair pro mar", eu os convidarei ao trabalho. Espero poder contar mais do que nos dedos os que virão.

Enquanto isso, conheçam (se já não faz parte deles) duas iniciativas com as quais tenho íntima relação:

- www.facebook.com/bipidonanelida (a biblioteca popular de meu bairro – em Itapecerica da Serra, São Paulo)

- www.facebook.com/oquintaldefulanaemelao (a cia. de palhaçaria da qual sou parte – em Planeta Terra, Via Láctea)

17.7.14

pouco barulho por muito

Ouço roncos
no quarto ao lado,
no estômago abaixo,
na garagem aos fundos

O bastante.

Cães,
sapos,
galos
lá fora

Ouvir
Ou ver

Olhar pra dentro:
crio grilos
mudos na cabeça

Bastantes.

11.6.14

grosso modo

desejo,
desde agora,
uma felicidade
grosso modo,
do tipo rude tapa na cara,
receita bruta não declarada
até o fim de um ano contábil

eu não me impedirei
de desperdiçar
quaisquer alegrias instantâneas,
economias das quais me arrependeria
de deixar numa conta-corrente
[no vermelho]

eu não poupo,
portanto,
gozos,
cuspes,
e carvões
por tão pouco

31.5.14

contabilidade

Eu,

emissor
de poluentes,
mensagens truncadas
e notas fiscais,

que tenho conta controle,
declaro renda como isento
e nunca entendi a bolsa de valores

mais entregue que mala-direta,
menos terra do que água,
mais ou menos destemido

Eu sou uma alma não-jurídica
cuja pessoa física
tem carne que está longe
de ser Friboi

Não sou consumível
imediatamente,
perecível que nasci

A fachada às vezes engana:
há vazamentos nas
entranhas,
com fedores humanos

Mas amor há também
naquilo que tem cura,
tem restauro

30.5.14

vazios

Saldo zero
Coca Zero
Zero Cal

Sódio zero
Nescau Zero
Zero à esquerda

Zero a zero
Edição zero
Zero tolerância

Zerinho ou um
Zero quilômetro
Quilômetro zero

Abaixo de zero
Nota zero
Dois-ponto-zero

E nadica de nada
Que preencha
Uma bexiga
Murcha

19.5.14

nossos problemas

Nós vivemos em um lugar cheio de problemas

Nós vivemos em um lugar cheio

Nós vivemos um problema:
Nós vivemos cheios

Nós vivemos
Nós de problemas:
Nós

25.4.14

refeito o capim

Ele valoriza apertos de mão, delicadas mordiscadas nas superfícies, pesos e contrapesos. Bermudas ao chão, intimidades e um tanto mais. Amorosos receios, ele os preza. Também preza pedacinhos de cumplicidade: atravessar na faixa de pedestres, retocar a tinta da travessia com o passar do tempo. Tensão, o tesão de ultrapassar o sinal amarelo, sapatear na quadra da escola de samba, comer acarajé pela metade, lamber sorvete de flocos.

Ele gosta de capins, mas não de cupins.

Ele me confundo. Eu o confunde.

No banco do carona, ele sou eu. Motor ligado e um tanque cheio de combustível. Abraços afetuosos na descida maior da montanha-russa - um elevador indo ao subsolo. Chocolates dando recados precisamente. Preciosos textos que não são entendidos por outrem. Contextos tampouco. 

E se assim é, que fique entre nós o que for fato, o que for hardnews e/ou o que, de fato, for literatura. Leituras inéditas se ocupam de minha cabeceira agora. Preparei muitos marcadores de página. Não quero finalizar um só livro de hoje em diante - até que eu mude de ideia mais uma vez. Prefiro poucas e boas recordações aos recordes impraticáveis das estantes. Escrevamos mais! Vamos além desses parágrafos iniciais, convido-me/o. 

20.4.14

foi bom pra mim

Acasos. Há casos. Há hahahas. E brigadeiros no café da manhã.

Abraços. Há braços. Há forças. E música na madrugada.

Há um dia.

11.4.14

Timor-Leste é o país do futuro

Verônica e Sheila são amigas
quase inseparáveis

é que Verônica,
vez em quando,
vai para o país do futuro

se para Sheila é madrugada em nossas praias,
para Verônica, é entardecer lá no leste da ilha Timor

quando para Verônica é teto de constelações,
para Sheila, uma estrela só reina

Sheila adora as viagens no tempo
que Verônica faz
embora a saudade se apresse
e apareça a qualquer hora em ponto

nos dias de jornada de volta pra casa,
é uma confusão só:
os ponteiros de Sheila tiquetaqueiam para frente,
os de Verônica vêm no reverso,
varrendo nuvens, continentes e oceanos

enfim, o presente chega de avião

é um abraço,
é um copo de cerveja
além do desejo mútuo
de que ambas permaneçam
quase inseparáveis,
como todas as amigas
(dessas que se confundem
por horas e horas
em qualquer terreno que estejam)
gostam de ser

8.4.14

alface à moda da casa

Hora do almoço. Aqui nesta praça de alimentação, ninguém é comensal. É todo mundo bicho que devora alface sem etiqueta alguma. Talvez, um nome bordado em tira de tecido a se por nos pezinhos da verdura: hidropônica, orgânica, envenenada. Qual é a sua? Dobrar a folha inteira, desdobrar-se para mostrar finesse no uso de garfos e facas - os primeiros sempre à esquerda. Nesta praça de alimentação, eu não me contento ao ver pessoas vestidas de Saint Laurent, Valentino e Chanel sem rasgar suas folhinhas com delicadeza. Eu não quero saber das suas etiquetas abaixo de cada gola - não é isso - mas das palavras que nunca podem ser ditas em um fast food. Um gole de Coca-Cola e tudo vai por água abaixo. Água e açúcar abaixo.

Glorinha Kalil não sabe o sabor de uma alface comida com as mãos, eu suponho. Glorinha Kalil não será convidada para minha próxima ceia em casa porque não sei me comportar em minha intimidade. Jantarei sozinho, fazendo rolinhos de alface com azeite e sal, levando-os direto à boca com as mãos. Oferecerei um banquete a mim mesmo: uma tigela cheia de crespas, lisas e roxas variedades de leveza crocante. Só cuidarei para não me intoxicar. Dizem que água sanitária resolve tudo; a gramática das etiquetas inclusive.

21.3.14

igualdade

A poesia é para poucos:
os que correm de potes de ouro e se vestem de céu
os que querem ser lembrados, mas que esqueceram o próprio nome
os que gostam mais de amores e dissabores do que de relatórios
os que se inspiram e que em si piram
os que negam as verdades e se entregam à dúvida

A poesia é para muitos:
os que se alimentam de versos e se emprestam às dores de barriga
os que brindam com taça vazias
os que enfrentam maremotos
os que se enfrentam
os que se doam

Rimas ricas ou rimas pobres,
todas são poesia

A poesia é para todos

20.3.14

lindo engano, ledo

A gravata que embeleza o traje
é a mesma que enforca

O Louboutin que combina com a bolsa
também sacrifica calos e joanetes

As aparências enganam
- as dores enganam não

8.3.14

a/mar/é

O amor é o mar. Já vi gente que só molha os pezinhos e quem experimenta apneias. Vi os que surfam e os que catam conchinhas. Eu vi neguinho se afogando, mas vi também deliciosas flutuações. Vi salva-vidas; vi vítimas de águas-vivas e tubarões. Vi respirações boca a boca, vi jangadas virando.

Vivi o mar e suas marés;
vivi o que amar é de verdade.

botões em minha casa

Descobri o que já não é mais a minha casa. De fato, não sei qual é a minha. De fato, não sei se quero mudar de casaco. De fato, nada é fato em mim. É tudo como uma camurça sobre um divã. Tudo superfície.

Quero ir para um lugar que não existe. Sim, esse lugar não existe, Arnaldo, eu sei disso.

Esse lugar sou eu.
E meus botões.

de_coração sem revista

eu fechei o livro depois de ler
fechei a cortina para mostrar o caimento
fechei a tampa do vaso

enrolei o fio dental daquele jeitinho
para jogar na lixeira

guardei os sapatos no lugar

aguardei com o sorriso tinindo
e as solas cheias de calos

esperei na poltrona da sala
depois de me cansar
entre os vãos do corredor:
percorri quarto,
sala,
área de serviço,
catando as coisas que espalhei
para não sair feio na foto

coloquei flores nos vasos

e me dei conta de que nossa casa
só não é capa de revista
porque nenhuma revista publica
o que é, essencialmente,
de_coração