21.4.10

Dia da Terra: mais reflexão produtiva; menos bandeiras decorativas


Não importa se você acredita na teoria evolucionista ou na criacionista do surgimento de nosso planeta e, por consequência, da vida nele. Importa mais uma atitude circulante e permanente sua no presente, revelando o que quer dele, para ele e com ele.

Existe sempre um discurso militante-ecológico que dissocia o ser humano do meio, como se a casa fosse mais importante do que quem a habita. Se Deus ou o Homem será o responsável pelo armagedon, só o futuro revelará. E a data exata não está registrada na bíblia, tampouco nas camisetas do Greenpeace. Mas como ele acontecerá, sim, isso está no nosso imaginário desde a infância.

Acabo de escrever a um amigo algo por email e acho que parte do texto pode ilustrar o que quero dizer acima. Só para situar: estava falando sobre um casal de amigos em comum a mim e a ele que gostam muito de decoração e investem bastante na construção de um interior aprazível para seu lar. Eu dizia que lhes daria algumas dicas de onde encontrar coisas legais e baratas de decoração aqui em São Paulo, já que trabalho em publicações do segmento e recebo infos sobre o assunto com frequência. Explicada, assim, a frase é: "Farei questão de dizer a eles que a casa deve ter mais espaço para circulação subjetiva do que vias abarrotadas de objetos decorativos".

Portanto, faço também questão de me autoparafrasear, com um quê de paródia, para você que lê o Colheita Seletiva: "o planeta deve ter mais espaço para a reflexão produtiva do que ruas abarrotadas de bandeiras decorativas". Menos falácia e mais atitude é o que precisamos para mudar o pensamento que monta sobre o lucro e exaure recursos naturais, resultado da soma da regência capitalista e antropocêntrica que incendeia nossas vidas.

Precisamos é de paz, da construção de uma cultura de paz econômica, religiosa e sociocultural. Somente depois que a bandeira branca convencer é que a verde terá algum valor educacional. "Falar de paz virou coisa séria. Não basta a estética, nem mesmo a ética, ou a inocência, ou o devaneio. É preciso militância. E não só a das ruas, circunstanciais e emotivas. Agora é também questão de escolha racional, com as conseqüências que isso envolve. É preciso que a paz seja uma opção política", escreveu a senadora Marina Silva em um artigo seu em comemoração ao dia da Terra, celebrado todo 22 de abril há cerca de 40 anos.

Mais um trecho do pensamento dela, que valido como sendo meu também, para ressaltar as minhas escolhas ecológicas e porque insisto em escrever neste blog mesmo com o pouco tempo que tenho em razão de viver sob um céu capitalista diariamente: "a qualidade de vida é direito humano, assim como a saúde, a educação, a habitação. E acumulam-se evidências de que a atividade econômica não precisa ser predadora. É desejável, viável e factível o caminho do desenvolvimento sustentável. Nada foi e nada será fácil na trajetória dessas ideias, mas elas se impuseram como alternativa e conquistaram adesões - ou, no mínimo, provocaram constrangimentos - em todos os segmentos da sociedade. Mexeram naquele recanto da mente e das emoções no qual está intacta a necessidade de ideais comuns e a crença de que um mundo melhor e sustentável é possível. Nós procriamos e criamos; é inevitável ter amor pelo futuro e compaixão pelo presente. O Dia da Terra exige uma atitude."

"Bandeira branca, amor
Não posso mais
...
Eu peço paz"*


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Saiba mais
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- Leia o ótimo artigo de Marina Silva na íntegra.
- Conheça a origem do dia em celebração à Terra aqui.
- Na foto, Adão e Eva - ops! - Fábio e Flávia (amigos meus) contemplando o resultado da criação ou da evolução da vida em um lugarejo do planeta Terra chamado Éden - ops 2! - Cristina, em Minas Gerais.
* quem cantou os versos foi Dalva de Oliveira em um contexto menos ambiental, mas tão apaixonado quanto o meu jeito de falar de um planeta possível.

vinte segundos

Elevador social, SESC Consolação, rua Doutor Villa Nova, 245, Centro. São Paulo, SP.
Sexto andar, por favor. Toda terça e quinta, na subida à academia do SESC Consolação, a senhora do elevador me escuta. E só isso. Na saída, muito obrigado.

Olhar para cima não resolve a vergonha de quem se vê em um espaço de quatro metros quadrados, sem fuga e levadiço. O ventilador no teto irrita o olho, embora seja por ele a única passagem para o escape se emergencial. Todos cabisbaixos para não se enfrentarem. Todos desconhecidos com suas vestes esportivas, suas mochilas cheias de timidez, toalhas de suor, água mineral, angústias matutinas, xampus, bermudas de laicra e barrinhas de cereal.

São vinte segundos até o andar do vestiário. A música é um cântico murmurado pela senhora que aperta os botões. Ele me remete às canções religiosas pelo timbre doce e as variações quase barrocas. Humhumhumhumhum.

Deixei que cantasse sozinha até semana passada. Me peguei no mesmo tom, acompanhando seu segredo musical, lamúrio não-identificado. Ela murmurava algo divino. Eu, uma tola letra do Fábio Júnior. São pequeninos grãos de areia tão fininhos que qualquer vento menino leva para outro lugar.

Depois disso, nunca mais cantou em minha presença. Depois disso, só me levou ao sexto andar em um silêncio incomodado.

Passarei a subir de escada na próxima ida à academia porque gosto mais de ascensoristas murmurantes do que de uma senhora triste e muda - guiando um elevador com plateia desatenta. Desligue seu celular antes do espetáculo.


Deus não sabe fazer poema

Eu escrevo torto
por linhas certas

Eu acerto as linhas
porque torto escrevo

Eu alinho o torto
porque escrevo e acerto

certo Eu, que entorto
o que escrevo
para não me alinhar,
não me alinhavarem

ninguém escreve certo por linhas tortas
porque Deus não sabe fazer poema

mal sabe Ele a dor de uma poesia verdadeira,
imperfeita e de pó,
de pé no chão

2.4.10

Vaga Viva - estacione


É isso mesmo, gente. A galera resolveu ocupar as vagas de carros nas ruas para chamar atenção para suas causas. Todo primeiro sábado do mês, a turma da Matilha Cultural promove a Vaga Viva, que enche alguma vaga das ruas, um lugar de carros, no centro de Sampa, de plantas, bancos, mesas, conversas e música. O objetivo é "a retomada do espaço público pelo cidadão", segundo um texto de divulgação que recebi por e-mail. Desta vez, como não viajarei na Páscoa, acho que darei um pulo lá para conhecer a proposta e, quem sabe, passar os meus primeiros sábados de todo mês com uma turma que pensa no comum e em alguma mudança.

No evento do dia 03/04, amanhã, eles discutirão a arborização do centro e promoverão coleta de assinaturas, reuniões, oficinas culturais e sessões de cinema e música. Se você estiver em Sampa neste feriado, vá.

E divulgue esta ideia também.

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O quê?
VAGA-VIVA + SHOW AUTORALL + OFICINA STENCIL
Quando?
03/04, sábado, 12 às 22h
Onde?
MATILHA CULTURAL, na rua Rego Freitas, 542 - São Paulo, SP
Quanto custa?
Entrada gratuita

Saiba mais
www.matilhacultural.com.br
twitter.com/matilhacultural
+ infos imprensa: nina@matilhacultural.com.br
(11) 3256-2636 

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Crédito da foto: divulgação.


Março se foi; a poeira, nunca

Você pode ou não saber, mas existe uma razão mais nobre que a comercial para se fazer do mês de março, especialmente o dia 8, um período do ano dedicado às mulheres. Receber flores do chefe, presentes das empresas, inúmeros cartões e jantares dos maridos não significa a real representação da data que, há cem anos, vem sendo marcada por lutas e manifestações dos movimentos feministas em todo o mundo.

É que em 1910, durante a Segunda Conferência Internacional das Mulheres Socialistas, a alemã Clara Zetkin propôs a criação do dia internacional da mulher. Mas a data que todos conhecemos, 8 de março, só veio a ser fixada mesmo em lembrança às operárias russas que, em 1917, promoveram uma ação reconhecida como o princípio da Revolução Russa. É daí que, provavelmente, o dia tenha sido escolhido. E, desde 1922, a data é símbolo de passeatas, discussões, marchas e outras ações em prol da reavaliação - e justificada equalização - de direitos e deveres entre homens e mulheres, e a criação de legislação e programas sociais que favoreçam a autonomia e a liberdade das mulheres em relação a diversos temas que pedem atenção sempre constante.

"O que defendemos é uma sociedade em que homens e mulheres sejam livres para desenvolver todas as suas potencialidades. O 'ser feminino' e o 'ser masculino' são construções históricas. Não podemos, em nenhum momento, dizer que somos iguais, pois temos corpos diferentes. E é urgente que essas diferenças sejam respeitadas", me explicou, por email, Eliane Barros - jornalista, feminista e ativista do movimento. Foi ela quem sugeriu este post no blog, que veio com certo atraso, mas mesmo assim pertinente.

Ainda que eu seja um homem e com o "ser feminino" em mim construído de uma maneira bastante peculiar, ratifico toda a proposta do movimento e apoio a revisão de todos os conceitos, especialmente quando se trata das diferenças entre homens e mulheres, físicas e comportamentais. "Uma delas, por exemplo, é que nós engravidamos e vocês, não. Dada essa diferença, exigimos o direito sobre nosso corpo, de optar por ter ou não o filho. Não se trata de defender o aborto, mas sim, de descriminalizá-lo e de tratá-lo como uma questão de saúde pública", ressalta Eliane. Agora, vai explicar isso para a liga das mulheres de Jesus Cristo neste país, onde uma rede de comunicação assumidamente católica disputa espaço com outra evangélica - e que, talvez, tenham lugares de mesmo tamanho e conforto nas salas das famílias hoje. É a hegemonia das redes de TV que vestem seu espectadores de culpa e pecado em detrimento de seu arbítrio livre. "Fazer as pessoas entenderem que o aborto é uma questão de saúde pública é o ponto mais difícil. Afinal, seria lindo se todas as mulheres tivessem condições de criar seus filhos, ou mesmo de ter acesso a todos os métodos contraceptivos", completa.

Em muitos momentos, eu tive vontade de lutar pela causa delas, saber como funciona o movimento, me aproximar de seus pensamentos. Eliane me explicou que não daria para participar das reuniões das construções dos atos (os dias em que elas planejam as ações), mas posso ter relevância nas manifestações públicas: "Não que o movimento seja sexista, essa é uma decisão histórica do movimento feminista, pois muitas mulheres não tinham coragem de falar diante dos homens tamanha opressão que sentiam", conta. Segundo ela, durante os atos (marchas, passeatas, panfletagem etc) a presença de homens é indispensável para ratificar a importância do movimento.

Embora a data tenha sido engolida pelas artimanhas do grande Espírito Capitalista para movimentar o comércio, ela é relevantíssima. O mês de março já era, mas a poeira não vai baixar nunca - ou, pelo menos, enquanto houver desigualdade e muitas batalhas pela frente. Eliane destaca: "Tendo em vista tamanha mercantilização de datas históricas como o 8 de março, com marcas de roupas e cosméticos fazendo uso dela para justificar promoções, acho importante divulgarmos o porquê dessas datas, como elas nasceram e tal. Caso contrário, muitos homens continuarão se perguntando: por que não existe um dia dos homens também?"

E que ninguém me pergunte isso jamais.

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Veja os panfletos produzidos por Eliane Barros e Paula Sambo (layout e texto, respectivamente), ambas amigas minhas, para a marcha que aconteceu na semana do 8 de março deste ano. Elas disponibilizaram para mim e eu gostaria de dividir com vcs. Basta clicar nas miniaturas que estão espalhadas pelo post para abri-las em formato maior. Salve no seu PC e leia.

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  MULHER DA VEZ















É uma menina ainda, mas com ideias firmes, fortes, complicadas de se dobrar. A linda da foto é Larissa, minha sobrinha, que cresce a esticões típicos da adolescência e amadurece com as tão intensas dores de deixar a infância para trás. Dedicada aos objetivos e com um senso de justiça imenso, será uma mulher de raiz, fibra e lutas - como são as mulheres que mais admiro hoje. Lalá, como a acarinho, foi clicada pela prima
Rafaela.