26.12.11

geleia

Jambos,
eu quero jambos de sobremesa;
forjar meus dentes no corpo branco
sob veste de sua cor própria

Quanta morenice tem essa feição
Feitiço, oferenda
Bruxaria do sol

Polpa adocicada
Suave seu suco,
seiva, silvo
Sève serve de perfume:
óleo afrodisíaco para dois

Venha pro banho comigo
Salivo de ver
roupa caindo,
vindo, vendo, tendo

Resquício de intimidade será
um pote de geleia
vazio

8.12.11

dábliu tem som de vê

- alô, você?
melhor teria sido
- olá, wocê!

um wacilo de uma mente em recente inquietude,
uma troca de saudações
em seu nome

o que eu diria se
fosse, realmente, com wocê;
se fosse assunto de seu interesse aquele?

papo reto:
ofereço um texto perspirante,
cheio de pausas para tomadas de fôlego,
wírgulas nos seus dewidos lugares,
transpiração,
e nenhuma wontade de ponto final

meu desejo é que, agora,
wocê fique

14.10.11

p-i-m-a

não vale dizer que toda canção
é sem fim
como amar

os meus refrões
são úmidas mordiscadas na orelha,
excitantes como a espera,
a expectativa,
de que se repitam

afinada cada corda esteja
para as batidas das próximas cifras,
copiadas de uma revista que comprei em um sebo
só porque vi nela a nossa música
- ou prefere que eu dedilhe
tudo de uma vez?

p-i-m-a!

depois que essa moda de viola passar,
restará um tocador desatinado
em posse de um desafinado instrumento

prepare-se:

enquanto você finge que gosta de serenatas,
eu canto músicas de ninar

prefiro a vigília a dois
sobre uma cama de molas
do que uma sonífera
roda de voz e violão
entre amigos sob a lua


às vezes, tenho dessas de errar o acorde

só para sentir que alguém está atento à música
além de mim mesmo,
só para saber que alguém mais
repara nas minhas unhas sem corte


- por favor, não toco Legião;
não insista

- não, não é fácil tocar uma do Roberto
como você pensa
e sua mãe gosta

...

eu, aqui, querendo fazer poema
com um banquinho e um violão
e você pedindo suas composições favoritas


- tenha dó!

18.6.11

poeta sem nariz vermelho

me encomendaram um poema sobre palhaços,
me jogaram no meio de um palco
para fazer sorrir entre cantos,
olhando para a plateia
ansiosa por uma gargalhada

ela vem de dentro, de um lado a outro da boca
pintada de batom,
suada como o nariz rouge no fim do esquete fica
_a palavra definitiva se chama "máscara"
e se apaga com os holofotes
porque "o cara" se esconde sob camadas de pancake;
depois, é cara lavada

improviso, inspiração

o palhaço é uma resposta
que não chega
nunca,
a carta mais esperada na caixa do correio,
um torpedo promocional da operadora de telefonia
no meio da madrugada

tá de brincadeira, né?

fazer sorrir é como ter contas a pagar,
é levar a sério o que nem é preciso
- pensar que o crédito do cheque especial está no fim;
e daí?

a hora mais feliz de um dia inteiro
acontece quando cruzo com ele
- que não sou eu, mas sou outro e eu também -
e soa como uma piada sem fim,
sem pé nem cabeça

o que eu quero com isso?

quero aplausos para um poeta sem graça alguma,
mas um palhaço imerso em melancolia
tentando ser feliz



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*para Fulana e Melão Cólico

30.4.11

check down

fui fazer uma consulta de rotina com um cardiologista

no estetoscópio,
silêncio

17.3.11

imersão

fluido manto de regenerar a vida
parte do mar é aguardente,
outra, sal e chão

canais de sertão esperam a passagem
dos veios adocicados,
dos velhos
Chico, Negro, Tietê

é, para mim, o presente divino
escondido em torneiras

quem pede um copo cheio de água
pede um gole de cru e solene remédio
para um corpo inteiro
se batizar

afinal, nada mais que alma imersa
em eme-eles de líquidos,
sonhos em calefação,
somos nós

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* Texto originalmente publicado em www.colheitaseletiva.blogspot.com, quando eu ainda tinha tempo para escrever sobre fechar torneiras, banhos rápidos e lixo nos mares. Não só no Japão há tsunamis atualmente.

18.2.11

poema sem futuro

Ela
esperava na janela
pelo porvir

Decidiu plantar no quintal de casa
coisas que, finalmente, amadureceriam
e se tornariam rugas e podridão

O futuro é uma exposição
de medos,
cascas grossas,
e sementes esperançosas

"O futuro nunca chega"
_ela se deu conta;
e passou a trancar as janelas
dali para frente

Vez ou outra,
observa pelas frestas da madeira
o que é a inquietação do outro lado da rua:
são crianças brincando de amarelinha

E só.