24.9.06

solucionando

a banana,
se verde,
é chiclete na boca

a maçã,
se verde,
suco refrigerante

a laranja,
se verde,
acidez detergente

a manga,
se verde,
faca e sal

o mamão,
se verde,
doce depois de açúcar

o limão,
se verde,
caipirinha

o amor,
se verde,
paixão sem solução

18.9.06

projeto literário

meu projeto é escrever um livro
cada linha numa posição virtual
num não-lugar ainda virgem

já cansei do lápis apontado
as canetas não me agradam mais
e o papel vez ou outra se rasga
de tanto apagá-lo

eu quero o pó
da cadente estrela de instantes antes
do armário onde guardo as bugigangas que colho no caminho
do chão de onde vim

eu quero o pó tirado de um livro futuro
de uma palavra à tinta de impressão rara
capa dura e uma nota de autor

eu quero animar o cosmos
voltar à plenitude que deixei para trás
e fechar um ciclo filosófico

meu projeto é um livro
meu projeto é virar a página
para ver se me escrevo no capítulo seguinte:
folhas em branco

10.9.06

empréstimo

com uma borracha apagam os dedos teus
numa fissura sem costume do meu desenho
meu corpo

cada deslizar é um risco
risco de ter-me em papel branco

não quero deixar vísceras espalhadas
pela cama, pela celulose pura

quero vestígios de minha presença ríspida
rija
rio
gargalhadas

as montanhas que os lençóis imaginam seus
vejo de pé
com os pés n'água

eu não vou te dar o gosto de me anular
porque não quiseras minha lembrança

meu caderno tem teu grafite
feito a unha e arranhões

eu não vou te dar o gosto
de escrever-me nesse teu caderno pautado
porque tua caligrafia é simétrica demais

mas ofereço meus lápis de cor
para me colorir
sem contorno

um empréstimo

3.9.06

improdução de domingo

. o Coração é um país bem interno ao continente sulafricano, onde há meninos descalços e cachorros calçados. quem tiver o segredo do perfume de Amália, vem ver a desconexão que um sorvete de chocolate provoca .

. vazios estão os dedos de idéias. os domingos são dias improdutivos, capital e mentalmente. eu quero ver um elefante de perto quando você chegar suja. darei ouvidos desatentos quando pedir meu sono. não me culpe pelos seus cabelos encaracolados. você é o que também não come .

. meu professor de Física namorou minha professora de Química sem dizer nada a ninguém. depois vão culpar meu professor de Biologia por ter espalhado boatos pela escola. só há vida depois da fecundação .

. Salvador me reservou o chocolate descalço. Como tudo lambendo os dedos que pressionaram a barra. calor Amália tem no seu perfume, minha professora. que química vem depois daquela física minúscula. pra resfriar, um sorvete. pra escutar, meus ouvidos dois.

[domingo tem um dia improdutivo
uma noite melhor, quem sabe